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quarta-feira, 8 de julho de 2009

Tratando de definir a participação popular
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Victor Vincent Valla
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No conjunto de discussões que há alguns anos se vêm intensificando sobre os rumos técnicos e políticos do sistema nacional de saúde, a questão da participação popular tem merecido destaque, sendo esta, entretanto, uma discussão marcada por ambigüidades que expressam as diferentes perspectivas com que se utiliza o termo. O tom vago e difuso em que a proposta de participação popular aparece em textos oficiais, ao lado de sua frágil normatização, tende a torná-la, como conseqüência, algo centralizado nas mãos dos técnicos e na burocracia governamental.
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Para se ter uma melhor compreensão do sentido da participação popular, é interessante situar algumas definições de ‘participação social’. De forma geral, participação popular compreende as múltiplas ações que diferentes forças sociais desenvolvem para influenciar a formulação, execução, fiscalização e avaliação das políticas públicas e/ou serviços básicos na área social (saúde, educação, habitação, transporte, saneamento básico etc.). Outros sentidos mais correntes de participação são: a modernização, a integração dos grupos ‘marginalizados’ e o mutirão.
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O termo modernização tem o sentido de superar atrasos tecnológicos e culturais de uma determinada sociedade. Equivale ao desenvolvimento de novas formas de produzir e consumir, de inovações tecnológicas (por exemplo: DDD, robôs industriais, caixa automática nos bancos, TV a cabo) e culturais (por exemplo, divórcio, hábito de lanches rápidos, aquisição de eletrodomésticos), que estariam introduzindo profundas mudanças na sociedade, das quais a população como um todo deveria participar.

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É possível que uma modalidade da participação social vise também fazer com que a população tenha a sensação de participar de algo de que nem sempre usufrui ou controla; a melhoria de vida da população seria uma decorrência dessa modernização. A realidade brasileira, no entanto, não confirmou esse pressuposto. Não há indicações de que as inovações tenham permitido uma maior participação da população. E tampouco o padrão de vida da maioria da população melhorou.

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A proposta da integração dos grupos ‘marginalizados’ parte do princípio de que a maioria da população, em razão da sua pobreza, encontra-se ‘fora’ da sociedade. É como se a dificuldade de acesso aos produtos e serviços básicos fosse uma decorrência da ignorância e passividade dessas populações ‘marginais’, ou para utilizar um termo mais atualizado, os excluídos, isto é, aqueles que estão ‘fora’, por sua própria culpa, precisando ser animados, incentivados, esclarecidos, para poderem participar dos benefícios do progresso econômico e cultural.

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Essa concepção tem raízes fortes em nossa sociedade, inspirando inúmeros programas governamentais e religiosos que há muitos anos vêm se desenvolvendo com vistas a integrar os chamados marginalizados. Esse tipo de participação obscurece o fato de que estes grupos marginalizados sempre estiveram dentro da sociedade, mas participando da riqueza de forma bastante desigual. A integração deveria, então, passar necessariamente pela garantia de empregos, melhores salários e serviços básicos.
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Uma das formas de participação popular mais utilizada é a do mutirão. Trata-se de um apelo, de um convite à população, principalmente a que mora nos bairros periféricos e favelas, para que realize, com seus próprios trabalhos, tempo de lazer e, às vezes, dinheiro, ações e obras da responsabilidade do governo. Em grande parte, os governos brasileiros, tanto o federal, como os estaduais e municipais, agem com a população de uma forma bastante autoritária, decidindo unilateralmente sobre a qualidade e quantidade dos serviços básicos. Quando, no entanto, percebem que não dão conta de um determinado problema (como a dengue ou a cólera, por exemplo), então conclamam a população a participar do combate e erradicação do mal através do mutirão.

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