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quinta-feira, 20 de maio de 2010

No início da vida
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Jucélia Marques
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Nos Funcionários I, bairro da zona sul de João Pessoa, ocorreu recentemente um trágico suicídio envolvendo um jovem de 17 anos. Até o momento, ninguém soube explicar corretamente porque ele tomou esta iniciativa de ter acabado com a própria vida.
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O acontecimento abalou todo o bairro e comunidades vizinhas, principalmente por se tratar de um adolescente, que tinha uma vida toda pela frente. Hoje em dia, é muito raro acontecer suicídio entre as pessoas nesta faixa etária. São mais comuns - infelizmente -os casos de estupros e pedofilia envolvendo crianças e adolescentes até 16 anos.
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As notícias sobre esta trágica morte foram exibidas nos principais jornais e telejornais de nossa Capital. De acordo com o relato de amigos do jovem falecido, ele estava com muitos problemas em casa e sofrendo pressões de todos os lados. Pessoas que não o conheciam choraram e disseram que ele não devia ter feito isto, tirar a própria vida. Por ser jovem, deveria ter mais disposição para viver, superar os obstáculos e seguir em frente.
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Atualmente, muitos jovens do mundo inteiro estão se drogando e se prostituindo. Alguns afirmam fazer isso por não terem outra escolha, por ser a única forma de sobrevivência que encontraram nas ruas. Outros, por terem fugido de casa, pela falta de boa convivência familiar, etc.
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Por tudo que foi apresentado até aqui, deixamos um recado importante para a juventude: nunca se deve agir por impulso, pela raiva, ou motivado por sentimentos de vingança, pois um dia você pode olhar para traz e se arrepender de tudo aquilo que fez de errado ou que deixou de viver.
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Rede Nacional de Comunicação Pública
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Pedro Caribé
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A Rede Nacional de Comunicação Pública, encabeçada pela TV Brasil em parceria com emissoras educativas em 23 estados, está no ar desde o último dia 3 de maio. A empreitada é um passo mais sólido para reverter a disparidade entre as emissoras do campo público e as grandes redes comerciais. A nova rede cobrirá 1.716 municípios, atingindo 100 milhões de brasileiros. Neste primeiro momento, a rede funcionará com transmissões simultâneas de dez horas de programação, sendo quatro de responsabilidade das emissoras associadas.
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O fortalecimento do conjunto das emissoras públicas e o modelo de rede que incentiva a produção local são apontados como os pontos fortes da nova rede. Porém, ainda há entraves ao seu pleno desenvolvimento. Alguns dos problemas já apontados pelas próprias TVs que tomam parte da rede e a Empresa Brasil de Comunicação (EBC) é o modelo de gestão das emissoras estaduais, ainda com forte ingerência estatal, e o Operador de Rede Pública Digital, que levará o sinal da TV Brasil e de outras emissoras federais para todo o país e está em fase final de licitação. A entrada em funcionamento do operador digital pode colocar as filiadas em numa faixa do espectro com baixa qualidade na imagem e impossibilitá-las de realizar multiprogramação.
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Além destas duas questões, defasagens na estrutura física, dificuldades na captação de recursos e, consequentemente, produção de conteúdo pelas emissoras locais são os outros obstáculos para uma relação equânime com a TV Brasil e também para a concorrência com as redes comerciais nas regiões de cobertura do sinal.
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Nas palavras de Tereza Cruvinel, diretora presidente da EBC, “a rede pública de televisão é um sonho antigo mas faltava dar centralidade ao projeto”, papel que teria sido cumprido agora pela TV Brasil. “A rede serve à expansão da TV Brasil, mas seu papel é muito mais estratégico: assegura maior equilíbrio entre os sistemas público e privado de radiodifusão e a circulação de conteúdos que efetivamente expressam as regiões e a diversidade. Acreditamos, ainda, que a rede injetou energia e disposição criadora a todas as televisões associadas”, analisa Tereza.
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Regina Lima, presidente da Associação Brasileira de Emissoras Públicas, Educativas e Culturais (ABEPEC), defende critérios diferenciados das redes comerciais ainda no modelo analógico. “É preciso pensar políticas globais mais definidas para se ter qualidade em todas as TVs”, comenta Regina, citando os casos da TV Cultura de São Paulo, da Rede Minas (MG) e a própria EBC como representantes diferenciadas na rede.
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FONTE: http://www.direitoacomunicacao.org.br
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Métodos utilizados no Jornalismo Investigativo
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Regiane Santos Barbosa
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O repórter precisa, primeiramente, para inverter tal situação, de faro para detectar que determinada declaração, número, documento, estatística, pesquisa de opinião ou situação tem algo de "estranho". Desconfiado, o profissional deve munir-se de ferramentas para investigar porque determinadas informações foram ou são omitidas.
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Essas ferramentas investigativas geram polêmica no meio acadêmico, no mercado de trabalho e na opinião pública, já que muitos profissionais utilizam de métodos escusos para conseguir informações exclusivas. Para muitos, o trabalho do repórter investigativo confunde-se com o da polícia e do Ministério Público, porque jornalistas vão a campo apurar fatos e utilizam-se de câmeras e gravadores escondidos, grampos telefônicos e vigília constante dos envolvidos, métodos utilizados pelas autoridades policiais e públicas.
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Alguns profissionais fazem uso de métodos pouco ortodoxos na investigação jornalística, como Percival de Souza, quando ainda era repórter do Jornal da Tarde. Ele arrombou um barraco para pegar uma foto de "João Boiadeiro", o doador do primeiro transplante de coração feito no Brasil. De acordo com o relato do colega de trabalho de Percival, Antônio Carlos Fon, o repórter "arrombou a porta do falecido, mexeu nas coisas dele, pegou o ‘boneco do defunto e mais: tirou todos os bonecos que ele encontrou na casa. Assim, se outro repórter chegasse depois, não encontraria nada".
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Além de utilizar meios ilícitos para comprovar determinado fato, muitos jornalistas condenam, nas entrelinhas da reportagem, como se detivessem o poder de um juiz de direito, os envolvidos no caso narrado. O jornalismo presta um serviço através de uma investigação, quanto a isso não há a menor dúvida, pois denuncia o que não funciona, mas não pode substituir o poder de orgãos do Estado.
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Para informar a sociedade de um erro, não justifica que o repórter cometa outro. Ele deve investigar o fato, mas com uma conduta profissional que celebre prudência. Um dos métodos para seguir esta conduta seria a mescla de algumas ferramentas do próprio jornalismo investigativo associadas às ferramentas de pesquisa das ciências sociais. Essa junção de métodos dá-se o nome de jornalismo de precisão.
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FONTE: www.observatoriodaimprensa.com.br
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O jovem fala de si
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Hebe Signorini Gonçalves (*)
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Em determinada pesquisa, realizada há alguns anos, 1.300 jovens foram entrevistados na região metropolitana do Rio de Janeiro. Entre outros aspectos, eles foram indagados acerca de quais seriam, em seu entender, os principais problemas da juventude, e quais as formas de enfrentá-los.
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Os resultados mostram que as questões relacionadas à violência, à droga e ao tráfico despontam como os principais problemas citados. Na descrição dos jovens, é a associação violência-droga-tráfico a resposta mais significativa. Observe-se que não se trata de problemas isolados que se potencializam, mas de uma única questão expressa em três vertentes indissociáveis, constituindo uma unidade discursiva. No entender dos jovens entrevistados, violência-droga-tráfico constitui um problema porque impõe um risco real - a ameaça à segurança pessoal - e uma limitação simbólica - representada no sentimento do medo que conforma os modos de viver e circular na cidade.
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Não há como escapar: polícia e traficantes aparecem como faces do mesmo problema; amigos de antes ingressam na marginalidade e não podem mais compartilhar espaços nem tampouco histórias de vida; freqüentar os bares, os pontos de encontro, é atitude que requer um esmiuçar constante dos riscos envolvidos; a ida à escola deve considerar, a cada dia, se é possível ir, ficar e voltar. A praça, que nas comunidades mais pobres é o lugar da vida social, nem sempre está disponível para a brincadeira, o namoro, o encontro com os amigos. Assim descrita, a vida nas comunidades emerge como o lugar de uma forma bastante peculiar de socialização, em que será necessário ao jovem exercitar a percepção, ficar esperto4 para escapar das inúmeras armadilhas que as trocas sociais oferecem. É preciso resistir à tentação do ganho fácil, empreender um esforço da vontade para aplicar-se nos estudos e formar um capital pessoal que mais adiante, transpostos os muitos obstáculos, possa vir a garantir um emprego que permita ao jovem apresentar-se à sociedade, finalmente, como adulto (cidadão responsável).
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O destaque aos dados coletados na comunidade de Bom Retiro serve para desmistificar a crença de que a violência decorre das atividades ligadas ao tráfico de drogas. Ali não há referência ao tráfico, mas, ainda assim, a droga é o problema mais citado; ela se conecta à violência pela via subjetiva, não pelas disputas de quadrilha pelo mercado da droga. No entender dos jovens residentes nessa comunidade em particular, o uso de drogas é uma escolha do sujeito, condicionada em grande parte pelos problemas que ele não quer ou não pode enfrentar: porque tem a cabeça fraca ou porque, diante das dificuldades com os pais em casa, elegeu a droga como uma resposta fácil para seus problemas.
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O julgamento moral que condena o uso da droga será aplicado, assim, às conseqüências que ela acarreta para o sujeito: a droga impede a dedicação aos estudos, esforço necessário na construção de um futuro estruturado com base no emprego sólido e nas relações afetivas estáveis. A droga compromete as relações de amizade e vizinhança, pois, drogado, o jovem se sente superpoderoso e quer matar todo mundo. Ao deslocar o tráfico, pode-se assim pôr em relevo as escalas de valor que orientam certas percepções do jovem: o núcleo de sentido em suas falas é a cabeça fraca, que afasta o jovem do emprego e da vida em família, e introduz a violência na esfera de suas relações pessoais. Mais que a segurança pessoal, preocupa o comprometimento de projetos de futuro que têm como rumo e norte a estabilidade econômica e afetiva. Consciente das dificuldades a superar para realizar esses projetos, o jovem deixa transparecer que só a cabeça forte o levará até lá.
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Não se trata de negar o risco das ruas, reconhecido como real. Todos os entrevistados fazem referência a uma violência que é difusa, que está em todo lugar, que alimenta seus medos e condiciona suas escolhas. O enfrentamento dessa dificuldade específica pede a ação dos setores públicos, em particular da polícia, instância que identificam como a responsável pelo controle da criminalidade urbana. Mas, incontinenti, apontam a polícia como parte do problema, pois ela é corrupta, entra nas comunidades pra esculachar, estabelecendo uma tensão que potencializa o medo e a violência, em vez de reduzi-los.
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Na ausência do público como fonte de suporte para a vida social até mesmo no que diz respeito ao controle da criminalidade, o jovem ressente-se da ausência do Estado. Diante de um poder público que não tem feito muita coisa, refluem sobre a família todas as expectativas de suporte e apoio. Não faço a mínima idéia de com quem ele [o jovem] pode contar hoje além da família, resume um entrevistado. Na frase: "a família é tudo", repetida por um contingente expressivo de jovens entrevistados, desenha-se a chave da construção de suas subjetividades. O apoio da família, vital para ampliar a chance de realizar os projetos de vida, é praticamente o último reduto de seus sonhos. É um apoio que se traduz na presença - conversar, acompanhar a vida dos jovens e ser companheiro nos momentos difíceis - e também no esteio econômico que permite atravessar a fase da vida em que não podem se sustentar.
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(*) Doutora em Psicologia, integrante do Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa e Intercâmbio para a Infância e Adolescência Contemporâneas, do Instituto de Psicologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
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FONTE: http://juventudesulamericanas.org.br
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segunda-feira, 10 de maio de 2010

Digitalização pode ser ruim para pequenas emissoras
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Mariana Tokarnia
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Quais são os modelos de rádio digital em teste no Brasil? O que eles podem oferecer? Quais as vantagens e desvantagens de cada um deles? O que a sociedade deve exigir? Essas foram algumas das questões levantadas pelo engenheiro e pesquisador do CPqD, Takashi Tome, durante o III Seminário de Legislação e Direito à Comunicação, promovido recentemente pela Associação Mundial de Rádios Comunitárias (Amarc). Para ele, os padrões avaliados atualmente (HD Radio/Iboc e DRM) no País podem dificultar a existência das pequenas emissoras. O seminário reuniu radialistas comunitários, acadêmicos e movimentos sociais, com o objetivo de discutir um modelo de comunicação que garanta a democratização e o acesso aos meios.
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A Rádio Digital, neste contexto, não poderia estar fora da pauta, principalmente após o lançamento da Portaria 290/2010, que institui o Sistema Brasileiro de Rádio Digital (SBRD). O documento aprovado pelo Governo recebeu várias críticas e não esclareceu as dúvidas da sociedade. Uma delas diz respeito a falta de clareza sobre o modelo a ser adotado. Desde o início dos testes, o HD Radio/Iboc, modelo da empresa estadunidense Ibiquity e o DRM (Digital Radio Mondiale), utilizado em alguns países da Europa, Índia e Rússia, tem dividido as opiniões e posições de empresas e setores da sociedade civil.
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Para Takashi Tome é difícil falar em um modelo ideal. “Não podemos defender um sistema ou outro. Devemos agora colocar as nossas demandas e desejos e exigir que sejam atendidos”, diz. Ele explica que o HD Radio/Iboc possui desvantagens em relação a repartição do espectro. A digitalização de um sinal analógico acarretaria um aumento do espaço ocupado por ele. Quando atua em ondas em FM, ocorre uma duplicação do espaço antes ocupado. Para ondas AM e OM, a transição fica mais complicada, já que o espaço é triplicado e isso faz com que ondas “vizinhas” não consigam se digitalizar. A escolha pelo padrão estadunidense seria vantajoso para grande emissoras, que garantiriam um maior espaço de atuação.
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Por sua vez o DRM, ocupa menos espaço na digitalização, ocorrendo até mesmo uma redução do espaço ocupado no espectro quando se trata de ondas em FM. No caso das AM, o espaço é mantido. Uma vantagem seria uma maior quantidade de emissoras, uma vez que haveria mais lugar no espectro. No entanto, mais uma vez, o modelo não se faz satisfatório para pequenas emissoras comerciais ou rádios comunitárias que, por possuírem baixa frequência, se tornariam inaudíveis com um espaço reduzido. Outro fator excludente para rádios de menor porte é o custo da digitalização, que varia entre US$ 35 mil e US$ 90 mil, considerados os dois modelos. “Por isso, não vejo na digitalização nenhuma vantagem para a democratização”, afirmou o pesquisador Tome.
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Rádios comunitárias
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Compartilhando dessa opinião, Cláudia Neves, radialista comunitária da Heliópolis, em São Paulo, acredita que a digitalização das rádios em nada vai beneficiá-los: “O nosso sinal ficaria péssimo se digitalizado e as grandes emissoras ainda aumentariam o delas”. Cláudia foi ao seminário se informar. Ela diz que em São Paulo, as rádios comunitárias estão fragilizadas pelas dificuldades de sobrevivência, mas que pretendem se mobilizar para o tema da digitalização.
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Para o professor da Faculdade de Comunicação da UnB Fernando Paulino “deve haver, a partir de agora, uma maior preocupação e mais debates em torno do aumento no número de canais, com o alcance de sinais e com o acesso de rádios públicas e comunitárias. O território brasileiro é muito grande e existe um grande número de rádios comunitárias. Elas devem ser consideradas”.
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Takashi Tome assume que um modelo adequado seria um desenvolvido para o Brasil. Levando em conta as nossas necessidades específicas. Mas, infelizmente, isso esbarraria em um grande obstáculo: “Falta de massa crítica”, constata. Ele explica que aqueles que seriam capazes de desenvolver o sistema estão envolvidos com a TV Digital. “Precisamos então ser realistas”, diz. Segundo Tome, a solução é que a sociedade trace claros objetivos para uma rádio digital e que façam disso uma exigência. Ele menciona alguns objetivos que devem ser buscados: melhor qualidade de som, interatividade, maior número de emissoras e pouca interferência.
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FONTE: http://www.direitoacomunicacao.org.br
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Sobre livros e leitores
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Archidy Picado Filho
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- O senhor sabe ler?
- Eu sou formado, seu Batista! Sou doutor!
- Perguntei se o senhor sabe ler.
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Minha mãe dizia que este diálogo aconteceu entre meu avô materno – que morreu antes de eu nascer – e um conhecido da família. Durante muito tempo fiquei a pensar na dúvida de meu avô. Como alguém que se dizia formado não saberia ler? Mais tarde, comparando a leitura em voz alta de meu pai – que lia fluentemente em quatro idiomas – com as de outras pessoas, inclusive a minha em meus exercícios primeiros, percebi o que meu avô Batista quisera provocar naquele “doutor”.
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Para ser honesto – porque a honestidade incondicional deve fundamentar o ato do escritor (e, para tanto, também deve se utilizar de sua imaginação à construção de suas metáforas, sempre a serviço de expressar a verdade em seus escritos) – penso que nas pessoas há certa vocação para leitor, tanto quanto há para escritor como para qualquer outra coisa. Porque poucos são leitores; menos ainda leitores de livros; menos ainda bons leitores; uma quantidade diminuta torna-se escritores, sendo um subgrupo dessa tendência os verdadeiramente geniais e, muito além desses, os considerados “divinos” entre aqueles reconhecidos como verdadeiros “instrumentos do Verbo”.
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Para aqueles que desde a infância se descobriram amantes de livros, quero dizer que começaram bem – embora a leitura os possa levar além de bosques encantados e a prazerosos e reveladores encontros, a lugares indesejáveis, cheios de demônios os quais a leitura nos revela escondidos num dos recantos de nossas almas, dando-nos a oportunidade de identificá-los e, às vezes, vencê-los.
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“Depois dos romances para jovens e aventuras históricas ou exóticas - escreveu o filósofo francês Edgar Morin em seu livro Meus demônios - vou, a partir dos treze ou quatorze anos – na adolescência, quando as leituras podem marcar profunda e intensamente o ser humano – descobrir os livros que vão ser mais importantes em minha vida. Um livro importante revela-nos uma Verdade ignorada, escondida, profunda, sem forma que trazemos em nós, e causa-nos um duplo encantamento, o da descoberta de nossa própria Verdade na descoberta de uma Verdade exterior a nós, e o da descoberta de nós mesmos em personagens diferentes de nós”.
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“Digo em autocrítica: até uma certa idade, a literatura prepara-nos para a vida. Ela canaliza o movimento entre o real e o imaginário. Aleita nossos tropismos afetivos. No final da infância, ela nos dota de uma alma... Ela propõe moldes sobre os quais se vestirão nossas tendências individuais, e este vestir, sejam roupas sob medida sejam de confecção, dará forma a nossa personalidade. Ela nos oferece antenas para entrar no mundo. Não quero dizer que ela nos adapta a este mundo: ao contrário, seus fermentos de rejeição e de inadaptação, seu caráter profundamente adolescente contradizem este mundo. Mas contradizem-no dando-nos acesso a ele."
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“Pelo romance e pelo livro cheguei ao mundo”, escreveu Morin numa demonstração de que, ao contrário do que querem outros, quando tudo nos faltar, será na companhia de um livro, nosso amigo mudo e, ao mesmo tempo, tão eloqüente, que nos descobriremos do Princípio aos fins.
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FONTE: http://recantodasletras.uol.com.br
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Padronização da humanidade: autodestruição coletiva
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Luís Carlos Lopes (*)
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Todo o ser humano é único e original. Não há ninguém que seja, com exceção dos embustes que induzem ao erro, uma cópia exata de outra pessoa. Os gêmeos univitelinos são muito parecidos, entretanto, são pessoas únicas, por vezes muito diferentes entre si, apesar de fisicamente bastante semelhantes. Mesmo que a ciência, nos limites de hoje, permita a clonagem dos genes de uma pessoa e consiga teoricamente fazer uma cópia exata de alguém, não é possível copiar as memórias e o caráter de cada um. Se no futuro, como se vê na ficção, torna-se viável enxertar as memórias retiradas de outros, transferir o caráter de alguém seria uma operação de difícil realização.
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O cerne do caráter de cada indivíduo está na moral, isto é, naquilo que ele acredita como certo ou errado e no modo que ele utiliza o que sabe. Muitos conhecem as mesmas coisas, mas tiram conclusões diferentes, por vezes, opostas. Não há como imaginar a clonagem da capacidade humana de decidir, de interpretar e de escolher o seu próprio caminho, dentro dos limites disponíveis para tal. A unicidade e originalidade de cada um são reafirmadas na multiplicidade de caminhos escolhidos nos mesmos contextos ou em situações diferentes.
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É verdade que as pessoas podem deixar para outros a prerrogativa de tomar decisões. É comum que existam seres humanos que se achem incapazes de decidir suas próprias vidas. A moral convencional ensina que os soberanos, os pais, os mestres e os deuses são mais aptos. Entretanto, não há como evitar que alguns se rebelem contra qualquer tipo de autoridade que lhes oprima e que busquem trilhar seus próprios caminhos na vida. Os regimes tirânicos e as democracias formais do tempo presente estão longe de dar a todos a mais completa liberdade de decisão. O voto pode ser comprado e a guerra decidida em gabinetes fechados. A opinião comum é uma mercadoria especial comercializada livremente na modernidade. Trata-se do principal artigo vendido nas mídias contemporâneas. Nem sempre os vendedores conseguem sucesso total. Mas, tentam diariamente vender ou revender.
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A unicidade e a originalidade das pessoas são fatos de grande impacto social. Estabelecem diferenças e modulam o caráter complementar de cada indivíduo no tecido social. Nem todos conseguem aprender a tocar instrumentos, cantar de modo virtuoso ou se rebelar contra a ordem. Existem, felizmente, os mais corajosos e os mais inteligentes. Há quem tenha mais força e proteja os mais fracos, bem como, estão sempre presentes os mais empáticos, isto é, os capazes de sentir o mesmo que os outros sentem. Apenas, alguns são individualistas, irascíveis e antipáticos. A grande maioria prefere viver junto aos seus, tal como seus antepassados, ou buscar um novo espaço onde sejam mais bem acolhidos. O gregarismo é uma das qualidades da espécie. Este traço permitiu que ela chegasse ao tempo presente, depois de mais um milhão de anos de evolução.
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Este mesmo traço gregário levou que na França do século XVIII se entendesse que todos os homens eram iguais em essência. Ninguém seria melhor do que os outros por descender de uma família aristocrática, por ter “sangue azul”. A igualdade entre os homens, a partir da Revolução de 1789, foi compreendida de vários modos. Os liberais a viram como a igualdade frente à lei e o novo tipo de Estado eleito pelo povo. Outros estenderam o conceito à idéia de igualdade social que viria a desabrochar no século seguinte, nos ideais socialistas. Muito rapidamente, os liberais e outros assemelhados tornaram-se tão cínicos quanto os velhos aristocratas, aceitando o princípio de se usar artifícios da lei para protegerem os seus pares. Alguns privilégios aristocráticos foram transferidos sem qualquer pudor para as novas classes burguesas e proprietárias. Nos países onde jamais houve uma revolução, é comum que eles se achem parte de uma nova espécie de nobreza, obviamente, de araque.
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A unicidade e a originalidade dos seres humanos existem para o bem e para o mal. Adorno falou em um de seus textos que os nazifascistas mais disciplinados não eram pessoas comuns. Portavam certas características que permitiam a assunção desta ideologia. Não é qualquer pessoa que pode ser um torturador ou alguém especializado em mentir sistematicamente através de um meio de comunicação qualquer. As pessoas são recrutadas para certas funções por terem características que as tornam aptas para desenvolver as tarefas requeridas. A flexibilidade moral permite que algumas pessoas façam coisas repugnantes aos olhos dos demais seres humanos. Existem os ainda piores que decidem e mandam outros executar o que sujaria suas mãos de sangue.
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A não ser nos casos em que a loucura se instala de modo devastador, as pessoas sabem o fundamental do que é certo e do que é errado. A humanidade produziu padrões histórico-culturais que ensinam a todos que não se deve matar ninguém, sem que exista um motivo muito forte para tal. O roubo e o furto só são humanísticamente aceitáveis, quando se vinculam a atos de justiça social ou relacionados à manutenção da sobrevivência. A apropriação de coisas dos outros da mesma comunidade, tal como fazem os corruptos, é algo moralmente insustentável. A intriga e a cizânia são repudiadas há muito tempo, infelizmente, continuam sendo fortemente usadas pelas mídias e por algumas pessoas como recurso de manipulação em massa.
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(*) Professor e escritor.
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FONTE: Centro de Estudos Politicos Econômicos e Culturais (Cepec).
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