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terça-feira, 3 de junho de 2008

Cultura popular e globalização

Elionaldo Varela
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Definir Cultura Popular como sinônima de folclore (“saber do povo”) implica, via de regra, tomar posição, escolher um ponto de vista, configurando uma tarefa tênue e exigente de certa dose de prudência na racionalização mais precisa do deste assunto. Há o enfoque ideológico-social, pensado pelo italiano Antonio Gramsci que vê a cultura erudita - a da escola aceita pela sociedade dominante - em série e paralelo com a criada pelo povo, cultura popularizada que concebe o mundo e a vida na contramão dos valores formais, ditos oficiais.
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Destaque-se também neste ângulo da Cultura Popular ingredientes petrificados antiquados tradicionais, conservadores, e até atrasados mesmos! Isso porque refletem duras e insuperáveis condições de vida do passado de quem a vivencia. Óbvio que há ao mesmo tempo, hábitos e valores criativos capazes de “bater de frente com a moral daqueles que dirigem a sociedade. Assim vê-se numa mesma face cultural um lado inovador e outro obsoleto.
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Na percepção de Gramsci há uma visão totalizante da Cultura Popular na qual o antigo mistura-se com aquilo que é novo, resultando numa dinâmica típica e vital para que conteúdos expressivos do folclore resistam ao longo do tempo. E isso ocorre apesar da ação forçada da batidíssima “cultura de massa”. De outro lado, reconheçamos: valores de conduta, hábitos e crenças estão ligados no interior da Cultura Popular, via rituais, formas gerais e específicas e expressas na “alma de um povo, por mais rude que este seja. Isso ocorre devido a capacidade de uma vivência existencial realmente mais emotiva do que plena de consciência de um povo. Por não saber refletir esse mesmo povo acaba por ver sua cultura, com seus costumes, em diferença com outra cultura,que pode ser a urbana (não erudita).
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Os aspectos funcionais da cultura popular “advogam” a seu favo, fortalecendo a tradição sedimentadora de vitais identidades pessoais e coletivas, contudo, mesmo com mecanismos próprios internos de coesão e da capacidade de se reelaborar constantemente, a cultura popular não consegue superar suas fragilidades diante de um mundo multicultural globalizado. Mundo, ao mesmo tempo pré, moderno e pós-moderno. Há recomposições, o se refazer, mas não o revigoramento blindado ( de resistência) ao que a cultura capitalista, “de massa” e globalizada impõe.
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A psicologia de quem vive e pertence ao universo de eventos do folclore, que inclui motivação e espontaneidade de manifestações , como aponta o sociólogo Florestan Fernandes, servem para afirmação do caráter reatualizador da Cultura Popular. Isso é o que ocorreu, por exemplo, com a quadrilha junina, cuja evolução pautou-se nas danças de salão da aristocracia francesa muito tempo atrás. O que era formal foi transformado em popular, sedimentando valores antigos de si mesma. Mas se a vida social de um povo e suas condições de existência sofrem ameaças corriqueiras, também a sua cultura, com seu folclore, é abalada. Apesar de todo esforço contrário. A partir daí, pobreza e desintegração impõe-se.
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Mas mesmo assim, após períodos de crises, a cultura popular sabe absorver e e reelaborar valores e produtos culturais de fora dela. De outras culturas, de modo a ver e se ver e sentir por exemplo, o mundo urbano. O problema mais ´serie posto é: a Cultura Popular (com tudo que lhe enriquece, lhe empobrece e lhe define) pode absorver ou atravessar a cultura de massa ou globalizada como dizem hoje, sem perder sua identidade? Pode a cultura de um povo rústico interagir com uma cultura tecnologicamente diversa, ideológica e capitalista, num ritmo constante e transformador sem sofrer diluições de identidade? O que pode ocorrer com os aspectos de uma tradição centrada em conteúdo simbólicos de suas raízes?
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Diante dessa situação poderá sobrar tão somente a arte (erudita, de massa ou rústica) como peça conciliadora via diálogo em busca de compreensão entre homens de culturas tão diferentes. Uns ligados a uma identidade ancestral e outros, tão modernosos ou pós-modernos. Nesse caso, sobra apenas conciliação de culturas via artes, tendo como meio de entendimento de universos diferentes, os mitos que alimentam os valores da culturais universais de todos os povos “cultos ou incultos”.
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