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terça-feira, 21 de abril de 2009

Redes sociais: uma prática inclusiva (parte II)
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Walter Ude
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As transformações no mundo atual têm atingido de uma maneira ou de outra a todos nós, independentemente da classe social a que pertencemos. Obviamente, as pessoas pertencentes às camadas pobres ou miseráveis estão mais expostas a situações de precariedade social que são muito mais graves, sendo que algumas delas chegam ao estado de uma verdadeira indigência. Nesse sentido, Castel (1998) nos alerta que, quando um indivíduo rompe com sua comunidade de origem e se sente desgarrado, a ponto de se sentir estranho ou ser estranho pelos outros que o rodeiam num lugar que antes era familiar, ele vive um processo que esse pesquisador nomeia de desafiliado.
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Nessas condições, sua noção de vínculo torna-se profundamente comprometida em termos de uma cidadania possível. Situações externas como essas necessitam ser revistas e repensadas, para que se possa criar várias formas de convivência, pois uma sociedade humana não pode deixar de adotar seus filhos e suas filhas. Mas quantos compatriotas estão aí jogados na rua ou na sarjeta? Quanto a isso Gadotti (1998) comenta: “Amar uma criança é amar todas as crianças, também a criança espancada, violentada, vítima da sociedade injusta (...) Não posso realmente amar plenamente meu filho enquanto existirem tantas crianças vítimas de violência.”
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Olhar fragmentado X perspectiva de redes sociais
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Como podemos construir um mundo mais humano se optarmos pelo isolamento social? Dia após dia, fica mais evidenciado que aquela forma tradicional de se pensar o trabalho social - onde cada um ficava isolado no seu setor -, atuando como se fosse o único trabalho possível de se realizar, não produz resultados que possam contribuir para uma vida em coletividade. Mesmo porque, no contexto atual, as instituições já não contam com as condições de trabalho que tinham até há alguns anos atrás, quando o assistencialismo e as medidas repressivas eram as principais estratégias para tentar conter níveis elevados de fome e de pobreza.
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Neste início de século, constata-se que a idéia de um pretenso especialista, capaz de deter todos os conhecimentos possíveis de uma determinada área científica, vai se tornando cada vez mais inviável, quando se pensa no resgate e no fortalecimento de uma sociedade civil, capaz de responsabilizar-se pelos rumos políticos, culturais e econômicos do seu povo. O profissional especializado numa única visão “técnica” corre o risco de tratar sua clientela de forma fragmentada, setorizada e desconexa em relação ao mundo social mais amplo.
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Dentro dessa lógica, funcionam mais como adaptadores do que como agentes de transformação social. Com isso, não se nega a importância de que se desenvolva uma certa especialidade numa determinada linha de trabalho ou de criação. Do contrário, pode-se perder as noções de fronteiras que distinguem os diferentes campos do conhecimento. Trabalhar de forma interdisciplinar, em que se trocam saberes, crenças e experiências diferentes, não significa perder a própria identidade.
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Outro problema sério do especialista é sua aspiração em se meter a decidir a vida dos outros. Ao se nomear e ser nomeado de “técnico” assume uma postura de tentar prescrever, prever e predizer a existência das pessoas, sem considerar a história, as necessidades, os desejos e o pensamento de um ser humano que comparece diante de si. Esse verdadeiro vício institucionalizado gerou relações de dependência entre profissionais e pacientes em vez de construir relações de cooperação, de emancipação, de reciprocidade e de responsabilidade pessoal e coletiva.
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Diante dessas constatações, propõe-se aos educadores sociais que devolvam aos sujeitos do seu atendimento a competência que eles têm para pensar e entender seus próprios problemas e sofrimentos, evitando assim, que fiquem submissos à perspectiva de um outro que, supostamente, teria a plena capacidade de definir suas vidas. Essa possibilidade só se efetiva em espaços de conversação, onde segredos e demandas sejam revelados e compartilhados por todos os participantes, de uma maneira sincera e num clima de confiança e de ética coletiva.
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Nesse contexto educativo, o trabalhador social se posiciona como um promotor de encontros, onde articula redes de apoio e de ajuda mútua. No entanto, deve capacitar-se para escutar o dito (Habermas, 1989), ou seja, mais do que ouvir o falado, deve escutar o dito – aquilo que está por trás do aparente ou do manifesto, pois apresenta níveis mais profundos de compreensão. Com essa meta, busca-se compreender o outro para que ele se compreenda e, com isso, toda rede que participa do processo possa elaborar suas próprias reflexões críticas. Contudo, torna-se fundamental o desenvolvimento de uma perspicácia, que habilite o educador social a formular boas perguntas, com o intuito de estabelecer diálogos que provoquem novas construções, ou seja, propostas e ações que vão além do que já se conseguiu construir.
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FONTE: Redes sociais: possibilidade metodológica para uma prática inclusiva. In: Carvalho, et al. (org.). Políticas Públicas. Belo Horizonte, Editora UFMG/PROEX, 2002.
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