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sexta-feira, 19 de junho de 2009

O poder oculto das comunidades virtuais (parte II)
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Tatiana Pereira Martins (*)
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Em termos sociais, até que ponto os brasileiros têm utilizado a tecnologia para a melhoria da sociedade e não apenas para usufruto pessoal? A internet tem propiciado aos seus usuários a grande intimidade existente entre habitantes de cidades pequenas, ou tem promovido o anonimato (ou pseudônimo) da vida metropolitana? Stephen Biggs expressa de modo efetivo este paradoxo: a internet, geralmente vista como uma vila global, tem se mostrado uma verdadeira selva urbana. Oferecendo a promessa de uma existência virtual sem contatos com a vida desconectada - compre de casa, trabalhe de casa, faça terapia de casa - a internet tem “suburbanizado” a existência humana.
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A grande flexibilidade e liberdade oferecidas pelas relações virtuais têm ocasionado a dispersão das relações pessoais e, o que é pior, da responsabilidade coletiva de cada indivíduo. Shapiro reflete em seu texto que um dos grandes desafios do mundo virtual é justamente conseguir transformar o poder de aglutinação de comunidades virtuais, de velocidade de troca de informações e de grupos organizados em interferências verdadeiras na sociedade. A evolução, a revolução e a transformação dependem de mudanças estruturais no cotidiano, na práxis social.
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Focalizando o contexto brasileiro, constata-se que as comunidades virtuais têm potencializado o contato e a organização de indivíduos em novas estruturas. Comunidades que começaram virtuais - a Comunidade Python Brasil e o Sistema de Inventário CACIC - passam a ter encontros presenciais em eventos como o PyCon Brasil e o Fórum Internacional de Software Livre (FISL). Com o crescimento destas comunidades, surge uma nova dimensão de poder, a qual muitas vezes passa despercebida pelos próprios envolvidos.
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Infelizmente, o poder das comunidades virtuais tem sido ignorado pela maioria da população, conforme pode ser observado em situações do nosso cotidiano. De um lado, milhões de brasileiros votam pela rede em programas de TV, como o “Big Brother”. Do outro, campanhas de defesa da Amazônia somam votos que não chegam à casa do milhão. Embora não seja uma análise qualitativa, os números são discrepantes e temos a mesma quantidade em potencial de votantes - os usuários conectados. Ou seja, se acessa a internet para salvar um rosto bonito do “paredão”, mas não se pode dar mais um clique para participar de uma campanha em prol do maior bioma terrestre do planeta.
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Ainda que sem reconhecimento, os movimentos das comunidades virtuais têm se tornado uma prática corriqueira e, aos poucos, as novas estruturas virtuais interagem com o mundo tradicional. O Brasil tem bases sólidas assentadas na direção da interação e integração social. Importante pensarmos em como as comunidades virtuais podem trazer resultados concretos de organização social e da reconfiguração da estrutura de poder vigente.
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Apenas tomando-se consciência deste movimento das comunidades virtuais será possível orientá-los para as ações efetivamente coletivas, tornar mais transparente o véu que encobre as relações de poder estabelecidas e reunir o que há de melhor nas comunidades virtuais e tradicionais, em benefício de uma quantidade maior de pessoas.
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(*) Engenheira de projetos no Centro de Pesquisas Renato Archer.
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FONTE: revista A Rede, n° 30, Momento Editoral Ltda.
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