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sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

A polêmica sobre a balcanização da Internet

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Carlos Castilho
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O assunto ainda não ganhou as manchetes da imprensa, mas já está na agenda dos estrategistas e estudiosos da comunicação há algum tempo, pois são cada vez mais claros os sinais de uma polarização entre adeptos e críticos da nova ordem mundial que está sendo lentamente implantada pelas consequências socioeconômicas e politicas da internet. A questão central é a manutenção da internet como uma rede unificada ou o seu fracionamento em múltiplas redes, cada uma com suas regras e tecnologias próprias. Não é uma questão simples, porque a linha divisória entre as duas partes não segue a clivagem tradicional entre conservadores e inovadores.
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Um estudo patrocinado pela ONU e realizado pela organização Freedom House mostrou como aumentou o controle, ou melhor, as tentativas de controle do acesso à internet na maioria dos 37 países pesquisados, entre eles o Brasil. O trabalho foca na questão das limitações ao livre acesso identificando governos repressores, cuja lista inclui tradicionais desafetos das grandes organizações jornalisticas do planeta. Mas o problema é mais amplo, porque se por um lado temos governos como os da China, de várias nações árabes, bem como da Rússia e ex-satélites soviéticos tentando controlar a internet para evitar rebeliões populares, temos, por outro, países considerados modelos de democracia, como os Estados Unidos, discutindo novas regras destinadas a criar diferentes padrões de velocidade de acesso com base no poder econômico do usuário.
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A balcanização da internet, fenômeno denominado de splinternet, pode não estar no horizonte imediato do documento da ONU, mas é uma idéia cada vez mais cogitada por tomadores de decisões em nível global em razão da crescente dificuldade dos governantes em controlar as consequências do uso da web pelos seus quase dois bilhões de usuários, especialmente aqueles afetados por instabilidade politica crônica. A fragmentação da internet poderá - teoricamente falando - facilitar o controle dos usuários, mas trata-se de uma medida que no médio e longo prazos terá consequências fatais para a economia digital e para todo o processo de produção de conhecimento em escala planetária.
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A segregação econômica, via criação de diferentes velocidades de acesso em banda larga, também vai na mesma direção. Este nacionalismo cibernético bate de frente com a tendência à globalização, que foi um dos fatores impulsionadores da criação da internet. Há, portanto, uma contradição flagrante que desafia os pensadores digitais porque anula boa parte das alternativas conhecidas. O principal dilema é a diversidade de interesses envolvidos nas tentativas de controle do acesso à rede mundial de computadores.
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Há motivos religiosos -- como os da igreja da Cientologia -- que defendem uma inviável privacidade total no uso da rede, ou a alegação de políticos australianos que propõem barreiras digitais à propagação de cultos evangélicos. Há questões morais como as alegadas pela maioria dos países árabes e pelos mórmons norte-americanos, contra a existência de sites pornográficos na internet. E a guerra de gato e rato de alguns governos contra blogueiros independentes e contra redes sociais como Facebook e Twitter, bem como o mecanismo de buscas Google. Caso todas essas iniciativas prosperem, teriamos, em teoria, um conglomerado de mini-repúblicas digitais administrando capitanias virtuais aglutinadas em função de interesses na internet e sem definição territorial clara.
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Segundo a pesquisa, o Brasil é um país onde a internet é livre, com o vigésimo nono lugar no ranking elaborado pela Freedom House, ganhando uma posição em relação à lista preparada pela mesma organização, em 2009. Estamos no bloco intermediário em matéria de inclusão digital, com um índice de 39% da população com acesso à internet, no mesmo grupo em que se encontram Turquia, Venezuela, Rússia, Arábia Saudita e China.
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A polêmica sobre a liberdade de acesso à internet está fortemente ideologizada porque a lista organizada pela Freedom House coincide com a dos países acusados de limitar a a ação das empresas jornalísticas e de violar os direitos humanos. Isto mostra como a questão da internet já foi incorporada à agenda da diplomacia mundial, num contexto bem diferente do existente na época da Guerra Fria. Tudo leva a crer que o divisor de águas não será entre governos, mas entre estes e os novos personagens surgidos na arena da comunicação depois do início da revolução digital. Estes protagonistas são os cidadãos comuns. Aí podem surgir situações curiosas como governos considerados democráticos batalhando junto com outros tidos como autoritários para manter o controle da internet e impedir que os milhões de blogueiros, twiteiros, usuários de redes sociais e do correio eletrônico ignorem o verticalismo e a hierarquização rígida dos sistemas políticos tradicionais.
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FONTE: www.observatoriodaimprensa.com.br
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