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quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Anorexia, instituições e subjetividades
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Ubiratan Pereira de Oliveira (*)
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O mundo contemporâneo se depara com determinados comportamentos e tendências impostos pela grande mídia e por alguns setores da sociedade que são facilmente assimilados pela grande massa da população de maneira irrestrita e até ilusória. O que preocupa é que essas tendências vêm afetando a cabeça e a saúde de muitas pessoas, uma vez, que elas só passam a ser aceitas quando se enquadram nesses padrões criados de forma aleatória.
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Sinal dos tempos, o avanço da tecnologia, da biomedicina, as intervenções do homem sobre o próprio corpo em busca de uma suposta completude, a discussão do limite ético de determinadas práticas, apontam para uma característica da contemporaneidade que beira a perplexidade. Parece não existir mais limites, nem barreiras do homem para o homem. Mas, como bem diz os Titãs: "nem sempre se pode ser Deus!"
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Quando partimos para o campo da moda, da estética, os sintomas são exacerbadores. A ditadura do corpo perfeito a qualquer custo, reforçado por grandes estrelas e celebridades e estimulado pelo mundo da publicidade, tem criado um sério problema de saúde pública no mundo atual. O aparecimento constante de sintomas e quadros constituídos de anorexia em modelos e pretendentes, desperta preocupações e nos coloca em xeque. O que realmente está por trás da anorexia? O que leva uma jovem a agredir o corpo e o organismo a ponto de levá-los em algumas situações a morte? Além do tratamento médico, o que fazer para entrar neste infinito bem particular das vítimas do mundo sem limites e anoréxico?
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A eterna busca pela felicidade irrestrita e pelo corpo ideal e perfeito esconde um limite estrutural do ser humano. Não somos seres completos e buscamos exatamente aquilo que nos falta, esse é o movimento de toda e qualquer pessoa, por mais singular e específico que seja o seu caminhar.
Para o que nos falta, o mundo moderno nos apresenta de bandeja vários supostos objetos de desejo que se inserem diretamente nas subjetividades e, muitas vezes, passam a determinar o modo de viver e de se comportar. O ter então supera o ser. O ter anoréxico que vende uma suposta completude e um passaporte para o sucesso se depara com a impotência do ser. O caminho difícil mais atingível é sair da impotência para a impossibilidade real que coloca o sujeito em outra posição diante do sintoma anoréxico. Em outras palavras, assumir que somos seres incompletos.
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É neste contexto que se faz necessário observar alguns movimentos que aparecem na tentativa de regular ou de reorientar algumas tendências da contemporaneidade. Recentemente, a França assinou a “Carta” contra a anorexia, uma espécie de compromisso público da indústria da moda, da publicidade e da comunicação, juntamente com o Ministério da Saúde, sobre a imagem do corpo e contra a anorexia. O parlamento francês também aprovou recentemente projeto de lei que pune de forma severa a publicação de informações e condutas pró-anorexia através de sites e outros mecanismos virtuais. No Brasil, a Assembléia Legislativa do estado de Santa Catarina aprovou uma lei que proíbe modelos muito magras de desfilarem nas passarelas do estado. São sinais institucionais que tentam ocupar um grande vazio de referência no particular de cada indivíduo.
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Por fim, as perguntas levantadas e as reflexões aqui postas talvez não necessitem e nem possuam respostas imediatas e esclarecedoras. Mas, é sempre salutar observarmos a realidade que muitas vezes se transforma em banalidade e atua como objeto de devastação das subjetividades humanas, trazendo reflexos para os sujeitos individuais e para o coletivo.
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(*) Psicólogo e vereador.
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