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domingo, 9 de agosto de 2009

Uma contribuição sobre o conceito de Mídia Livre
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Renato Rovai
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Nós somos blogueiros, revisteiros, documentaristas, fotógrafos, ilustradores, jornalistas, radiocomunicadores, professores que não têm a mídia comercial como referência do seu trabalho... Somos ativistas da luta pela democratização das comunicações. Somos muitos. Estamos hoje produzindo boa parte das informações que constroem a reflexão do movimento popular mundo afora. Somos muitos e por isso já incomodamos demais. Não somos mais nós que nos preocupamos com os conglomerados comerciais de comunicação. São eles que hoje querem nos impedir de existir. São eles que se preocupam com nossas ações, com as nossas construções. São eles que dizem que nossas rádios derrubam aviões. São eles que fazem campanhas publicitárias para ridicularizar nossos blogues.
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Para ampliar o midialivrismo, precisamos e devemos ter apoio do Estado. E não devemos tratar essa questão nem com pruridos nem a partir da mesma lógica assaltante dos conglomerados comerciais. Precisamos pensar em novos modelos de financiamento. Tivemos uma mesa no último Fórum Social Mundial onde foi lançado o edital de criação dos Pontos de Mídia Livre e dos Laboratórios de Mídia Livre. Trata-se de um novo modelo de financiamento de veículos de informação que terá o apoio do Ministério da Cultura. Poderão se inscrever organizações e pessoas físicas. E os veículos serão julgados por uma comissão que vai avaliar o interesse público daquele produto. Isso muda a lógica da repartição dos recursos. É uma construção inspirada nos Pontos de Cultura, que a partir de agora também poderão se reivindicar Pontos de Mídia Livre. É algo novo e que precisa ser discutido por todos nós para que possa vir a ser, inclusive, melhorado e ampliado.
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Bem, mas o que é esse nosso movimento? No que ele se diferencia do que a gente chamava de mídia alternativa? Considero que este nosso movimento foi semeado em 1989, quando foi criada a WWW. (a rede na internet) . Também foi o ano quando caiu o muro de Berlim. E acabou a guerra fria que dividia nossas opções políticas em a favor ou contra um dos dois blocos que dividiam o mundo. Do ponto de visita simbólico e do ponto de vista geopolítico real, acabava a sociedade dos contrates. Iniciava-se o ciclo do plural, da multipolaridade. Há muito o que se discutir em relação a isso, mas o que vivemos hoje tem relação com esses dois acontecimentos históricos. Podemos dizer, de forma até ilustrativa, que a geração que está construindo o que a gente chama de movimento mídia livre hoje é filha de 1989. Desses dois acontecimentos históricos. Como a geração que fez a mídia alternativa foi filha do que aconteceu 1968. E que acabou acontecendo também em 69, 70, 71...
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A história da imprensa alternativa no Brasil foi intimamente ligada ao período da ditadura militar. O professor Bernardo Kucinski, que vai estar na próxima mesa, afirma em seu livro “Jornalistas e Revolucionários” que entre 1964 e 1980 nasceram (e morreram) aproximadamente 150 periódicos que faziam oposição ao regime autoritário brasileiro. Eram todos de papel. E quase todos panfletários. Principalmente os que se reivindicavam políticos. Porque alguns daqueles veículos também não eram só políticos. E se inspiravam no movimento da contracultura francesa e estadunidense. Um deles, o Pasquim, foi um sucesso editorial. Até hoje nenhum produto de papel fora da mídia tradicional vendeu tanto quanto o Pasquim, que chegou a tiragens semanais de 100 mil exemplares. Mas, mesmo o Pasquim era caracterizado pela luta contra a ditadura. Pode-se dizer, sendo assim, que a imprensa alternativa no Brasil foi feita de papel (com jornalismo impresso) e que existiu para combater a ditadura militar. Por isso, depois que a ditadura acabou, os jornais alternativos também foram acabando. Ainda hoje há veículos que se reivindicam alternativos, por conta de sua linha editorial diferenciada. Mas eles não representam mais o movimento que os inspira.
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A mídia livre é outra coisa. E tem outras abas, como se diz no mundo virtual. Pode-se até dizer que ela tem inspiração jornalística na imprensa alternativa, mas suas demandas e construções são de outra ordem. Bem mais diversas, bem mais plurais. Então o que caracteriza o nosso movimento e o que nos torna midialivristas? O movimento de mídia livre não é apenas uma construção de jornalistas e/ou militantes políticos de esquerda. Ele é muito mais amplo. Quando se definiu pelo nome Mídia Livre uma das intenções era exatamente a de se associar a luta dos softwares livres e das rádios livres. Mas também a de demonstrar que a construção do movimento tinha por princípio a liberdade como valor.
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A luta contra os monopólios corporativos, contra a censura da informação, contra o bloqueio do acesso ao conhecimento. E que buscava ser não uma instituição, uma associação, mas um espaço livre para articulações e para o fomento de iniciativas inspiradas na dinâmica do compartilhamento e na construção da cultura do comum. De alguma forma isso é o que nos define. Não é necessário ser de esquerda para ser midialivrista, mas é impossível sê-lo sem estar associado à prática do copy left ou do creative commons. Quem pensa o mundo na lógica do copy right não pode se reivindicar ou se reconhecer midialivrista. E ser midialivrista também é um ato de se reivindicar e se reconhecer. É por isso que quase todos os midialivristas são de esquerda. Porque não estão associados à crença de que tudo passa pelo mercado. E de que precisa virar mercadoria. Como eu vi outro dia o meu amigo Sergio Amadeu dizer, não existe almoço de graça, mas existe software livre e gratuito. E milhares de pessoas trabalhando sem receber nada para desenvolvê-lo. Plagiando o Sérgio Amadeu, não existe almoço de graça, mas existe informação gratuita. E livre das influências do mercado. Sem ter sido pensada para fazer parte de um projeto que precisa de publicidade comercial, por exemplo, para existir.
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Quanta gente em todos os cantos do Brasil e do mundo não está trabalhando de graça para contestar as versões dos conglomerados midiáticos? Quanta gente não está fazendo rádio livre e comunitária nas favelas brasileiras para poder levar prestação de serviço e opções de cultura e lazer diferenciadas para milhões de pessoas? Quanta gente não está fazendo produções em vídeo e construindo um registro alternativo dos nossos tempos ao postá-las, por exemplo, no youtube? Quanta gente sem ganhar nada não tornou a Wikipédia em um enorme manancial de informação? Os midialivristas fazem comunicação porque a entendem como direito humano. As pessoas querem se comunicar, dizer o que pensam, opinar. Elas precisam fazer isso para se sentirem participes de uma sociedade democrática. Até porque sem uma ampla diversidade informativa, a democracia se apequena. Torna-se de grupos, de poucos. Daqueles mesmos grupos que levaram com que milhares de pessoas de todas as partes do planeta se dirigissem em 2001 para Porto Alegre e gritassem: “um outro mundo é possível”.
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Por isso, dá pra afirmar sem medo de errar que o movimento da mídia livre é essencialmente político. Até porque ele coloca em xeque a lógica do sistema capitalista. E para usar um outro termo desgastado: ele é revolucionário. Nós, midialivristas, temos muitos desafios pela frente. Mas não poderemos enfrentá-los se quisermos ser a antítese em conteúdo daquilo que criticamos. Mas ao mesmo tempo não podemos nos seduzir pela forma daqueles que hoje oprimem. A mídia livre precisa apostar na horizontalidade. Num movimento de milhões. E não em grandes projetos de alguns. Em outros grupos grandões de comunicação que se digam mais pra cá do que pra lá. Que tenham um discurso mais próximo do que acreditamos. Precisa ser colaborativa, horizontal, comum e livre de interesses de grupos. É isso que pode fazer com que esse movimento se amplie. E se torne de fato importante e revolucionário. Ser midialivrista é também ser revolucionário!
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FONTE: http://www.revistaforum.com.br
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