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segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

A tragédia sensacionalista

Flávia Nascimento
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A necessidade de fabulação e de dramatização do real é inata ao ser humano. Este fenômeno é explicitado nas narrativas jornalísticas que cotidianamente fazem da realidade um espetáculo. As catástrofes contadas nos jornais, chamadas vulgarmente de tragédias, não são nada mais do que o mais puro exemplo dessa dramaticidade da realidade.
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A tragédia é em princípio, um gênero dramático, cuja origem é obscura, mas, no entanto, sabe-se que derivou de cantos e danças realizadas ao deus grego Dionísio. Conta-se que estas apresentações foram criadas pelos sátiros – criaturas meio bode que cercavam Dionísio em suas orgias. O termo tragédia deriva das palavras gregas "trago", que quer dizer bode; e "ode", que significa canto; as quais combinaram-se na palavra tragoidia (canções de bode).
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De acordo com Aristóteles, a tragédia defini-se como uma “imitação da ação de caráter elevado, completa e de certa extensão, em linguagem ornamentada e com as várias espécies de ornamentos distribuídas pelas diversas partes (do drama), (imitação que se efetua) não por narrativa, mas mediante atores, e que, suscitando ‘o terror e a piedade, tem por efeito a purificação dessas emoções’”. Em outras palavras, a tragédia dramatiza os sofrimentos humanos acerca da inexorabilidade do destino, onde o drama é regido por sentimentos como vingança, ódio, honra e glória. O que move a tragédia grega, inglesa, medieval ou moderna são sempre os sentimentos humanos que tomam conta da representação dramática trágica.
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É comum usarmos a palavra tragédia para nos referirmos a um acontecimento doloroso, catastrófico, acompanhado de muitas vítimas, ou ainda para caracterizar uma paixão que resultou em um horrível assassinato. Esse tipo de aplicação ao termo tragédia ocorre geralmente nas narrativas jornalísticas, onde os atores sociais são os heróis e personagens que fazem mover a tragédia no teatro real da vida. O jornal faz da realidade um espetáculo, e em sua narrativa moderna real dramatiza a vida desses atores sociais. A mídia faz da narração dos fatos um sensacionalismo, ou seja, mexe com o sistema emocional do público através da exploração do sofrimento alheio, com a finalidade que qualquer outra instituição de fins lucrativos deseja: lucro. Nesse caso: audiência.
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Fazer dos fatos reais um espetáculo é comum nos meios de comunicação, principalmente nos jornais, sejam eles impressos, televisivos ou online. As “tragédias” contadas nas narrativas jornalísticas são partes fundamentais desse sensacionalismo midiático, pois o que poderia mexer mais com o lado emotivo do público do que a tristeza causada por uma catástrofe na vida de uma pessoa?
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A tragédia foi tirada do seu habitat natural, o gênero dramático, e foi introduzida na mídia por puro sensacionalismo. Quantas “tragédias” reais acontecem pelo mundo? Quantas são notificadas? Quantas são escolhidas a dedo para serem exibidas? Digo exibidas, por que é literalmente um exibicionismo mostrar o sofrimento e ainda lucrar com ele. Tragédia no jornalismo não está em sua forma natural, não é uma tragédia ... é antes modo de fazer sensacionalismo. Mas no fim é isso que acontece: A vida imita a arte, e o jornalismo tenta imitar a tragédia.
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FONTE :http://www.canalpb.com.br
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