Juventude brasileira: tradição e modernidade (parte 2)
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Hebe Signorini Gonçalves (*)
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No Brasil, a família - e a cadeia de relações que se estrutura em torno dela - ainda é uma forte referência da subjetividade, sobretudo entre as camadas mais pobres da população. As cadeias migratórias articulam-se em torno de relações de parentesco e amizade tanto no que diz respeito à busca pelo trabalho como na eleição dos locais de moradia. Admitindo que os laços de parentesco falam da tradição cultural e contrapõem-se aos padrões pós-modernos, seria preciso admitir aqui uma permanência da tradição, tornando tensos os apelos da modernidade.
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Ao descrever a vida urbana, referindo-se ao município de Curitiba, Sanchez (2001) destaca sua multiplicidade irredutível de sentidos. Lendo a cidade como um território de disputas simbólicas, de jogos e discursos em permanente confronto, a autora marca a impossibilidade de reduzi-la, e a seus cidadãos, a uma única definição. Do mesmo modo, Castro descreve a urbe como a geografia do múltiplo e do variado, lugar que acolhe uma "coletividade de indivíduos singulares na qual todos têm o direito de buscarem suas vias de expressão pessoal".
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Hebe Signorini Gonçalves (*)
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No Brasil, a família - e a cadeia de relações que se estrutura em torno dela - ainda é uma forte referência da subjetividade, sobretudo entre as camadas mais pobres da população. As cadeias migratórias articulam-se em torno de relações de parentesco e amizade tanto no que diz respeito à busca pelo trabalho como na eleição dos locais de moradia. Admitindo que os laços de parentesco falam da tradição cultural e contrapõem-se aos padrões pós-modernos, seria preciso admitir aqui uma permanência da tradição, tornando tensos os apelos da modernidade.
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Ao descrever a vida urbana, referindo-se ao município de Curitiba, Sanchez (2001) destaca sua multiplicidade irredutível de sentidos. Lendo a cidade como um território de disputas simbólicas, de jogos e discursos em permanente confronto, a autora marca a impossibilidade de reduzi-la, e a seus cidadãos, a uma única definição. Do mesmo modo, Castro descreve a urbe como a geografia do múltiplo e do variado, lugar que acolhe uma "coletividade de indivíduos singulares na qual todos têm o direito de buscarem suas vias de expressão pessoal".
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Os centros urbanos brasileiros, marcados pelas enormes distâncias sociais, põem em contato territórios informados pelo simbólico e permeados pelo econômico. Nesse particular, nossa geografia urbana impõe experiências que diferem de qualquer cidade das sociedades centrais. A disparidade de renda, a presença ou ausência das benfeitorias sociais e a maior ou menor dificuldade de acesso às benesses são os elementos mais visíveis da rede de significados que o jovem deve aprender a decodificar. A convivência com o outro, na interconectividade das histórias vividas, mostra que uns têm acesso amplo ao conjunto de benfeitorias sociais, outros renunciam a elas e alguns se apropriam daquelas que lhes parecem indispensáveis. Assim, o jovem é chamado a construir ativamente as redes de significado, sob pena de sucumbir aos apelos do estranho e aos perigos da cidade. Nessa posição, que é necessariamente ativa, há de haver um nucleamento de sentidos passível de identificação. Como o jovem mapeia os territórios urbanos e com base em que premissas se move entre eles?
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A pichação, com a qual o jovem quer imprimir sua marca pessoal às ruas da cidade, e a zoação, o desafio do outro por meio da galhofa e do desacato, são exemplos de atitudes comuns aos jovens, que, se contêm um viés de agressão, são também formas de reivindicação: "[...] o chamamento do outro, para que preste atenção e se volte para aquele que zoa, que reclame, que tome uma posição e que ponha limites. Na verdade, zoar pode se tornar uma forma desesperada e última de estabelecer vínculo".
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Esse atravessamento de sentidos, em que o desejo de diferenciação do jovem se confronta com os anseios de regulação e controle próprios da ordem social instituída e adulta, ganha contornos típicos numa sociedade em que a regulação se exerce a partir do doméstico. Diante da tibieza das instituições, cabe à família, e àqueles que lhe são próximos, promover em primeira instância a regulação da conduta. Como a família dará conta dessa função reguladora cujo alcance deve exceder o doméstico?
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(*) Doutora em Psicologia e integrante do Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa e Intercâmbio para a Infância e Adolescência Contemporâneas, do Instituto de Psicologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
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FONTE: http://juventudesulamericanas.org.br
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